O Ensino Superior e as Nuances do Momento do Setor – conhecer o passado, gerir o presente para construir o futuro.
Justificativa para o texto: Falar de educação para quem vive o setor por décadas é algo muito encantador, as ideias para o texto ficam cheias de cores e cheiros, que vem com as lembranças que são retomadas para orientar a organização do texto e contextualizar com fatos as previsões ou opiniões expressas.
Para falarmos da realidade do setor educacional, com destaque para o ensino superior, neste momento de retomada pós pandemia, quando o setor, como tantos outros, precisou se reestruturar para atender demandas imediatas causadas pelo isolamento e também para se apresentar como motivador para os jovens que se firam sem perspectivas a luz de um novo momento da história do home, da economia, da aplicação de novos recursos tecnológicos e de novos processos.
Não podemos deixar de referenciar a educação como descrita na sua lei mais importante, após a constituição: a Lei de Diretrizes e Bases de 1996, que traz a educação como um bem social!
Assim descrita a “Educação”, a dificuldade de se entender o setor educacional como um setor de negócio, que precisa assegurar sustentabilidade para os prestadores deste serviço, é grande e se complica ainda mais quando é sabido que o resultado de um “serviço de formação” mal desenvolvido afeta a sociedade de maneira muito intensa e por anos.
Analisar o setor da educação superior, para prever a sua evolução e fazer considerações sobre seus aspectos atuais exige uma reflexão importante sobre sua história e características inerentes deste setor.
É importante lembrar que por ser a Educação um bem social, somente há menos de 25 anos (1/4 de século) o setor da Educação Superior se tornou um setor com instituições com fins lucrativos, ou seja, até o final do século passado, as Instituições de Ensino Superior: Faculdades, Centros Universitários e Universidades Privados eram todos Sem Fins Lucrativos.
O MEC como órgão regulador, analisava solicitações de criação de Instituições de Ensino é atribuía uma licença para a prestação deste serviço, visto como de apoio ao estado para atender e oferecer o bem social Educação.
Ter lucro educando era algo visto como inaceitável na visão dos atores deste segmento; desta forma, por anos, os detentores destas licenças identificaram formas de serem remunerados pelo serviço, alugando seus prédios para as instituições, gerindo as mesmas com seus familiares, de forma que, mesmo não gerando lucro, os mantenedores e seus “associados” eram beneficiados com as mensalidades e as instituições se mostravam não rentáveis nos balanços pós-custo.
Este ecossistema que se construiu criando ilusões, identificando registros que demonstravam eficientes para provar baixa eficiência financeira no CNPJ, mas alta lucratividade nos CPFs dos mantenedores. Este mundo de ilusões se baseou por anos, durante boa parte do século passado, de uma política similar a do café com leite (esta era da alternância do governo federal), a política do “biscoito e da bolacha”, de um lado o João Carlos Di Genio, mantenedor da Universidade Paulista – UNIP e do outro o outro João, o João Uchoa Cavalcanti Netto, mantenedor do Grupo Educacional Estácio de Sá, uma marca carioca de ensino superior, daí o “biscoito e a bolacha”.
Por anos, por décadas, um acordo tácito entre os dois inovadores e disruptivos da época, garantiu que nunca as Unidades UNIP chegassem ao Rio de Janeiro e as unidades Estácio de Sá chegassem aos municípios do estado de São Paulo.
Cabe destacar, que neste tempo, a oferta de ensino superior era para poucos, para descendentes de castas altas e de algumas famílias que se mostravam evolutivas da classe média; à medida que setores iram evoluindo da economia brasileira.
Como em todos os acordos de gaveta, uma hora eles são esquecidos e rompidos e foi do lado carioca que surgiu um ímpeto de crescimento e na época em que unidades da Estácio de Sá, ensino presencial, se proliferavam como fungos (bastava abrir a geladeira e lá estava uma nova unidade de ensino superior da Estácio de Sá) o Centro Universitário Radial, foi comprado pela Estácio e no quintal das unidades UNIP surgiu uma concorrência.
Esta história tem a finalidade de caracterizar um setor que tem como serviço um bem social, uma relação de atores que tem poucos anos que passou a se enxergar como instituições que devem atender sua finalidade, ser sustentáveis e valorizar seus mantenedores e acionistas e tem um histórico de pactos e acordos não triviais em segmentos de negócios com regulação mais intensa e bem estabelecida, até com órgãos reguladores privados.
Mas a vida é esta, os países produtores de petróleo, associados na OPEP também operam seus negócios manipulando os fluxos de produção aumentando ou diminuindo o valor do barril do petróleo na medida que sentem necessidades de ampliar a oferta ou aumentar os seus ganhos. Obviamente, com a chegada de novas fontes de energia e só assim, surgirá a oportunidade de substituição desta fonte de energia suja e vinculada a um monopólio impossível de ser quebrado só com a regulação.
O Setor da Educação Superior brasileira está vivendo um momento de ajustes e estabilização. Nos anos 80 e 90 do século passado, o setor se construiu, com a implantação das grandes marcas que sobrevivem até hoje, com pequena e grande escala de atendimento. No final dos anos 90 (ainda no século XX) e na 1ª década do século XXI foi o período de estabilização como setor de negócios rentáveis, as IESs se transformaram de sem para com fins lucrativos e tivemos os primeiros IPOs (destacar que a UNIP, a bola da vez, ainda é sem fins lucrativos), na 2ª década do século XXI temos o período das consolidações, grupos como Ser Educacional, Cogna (ex Kroton), Anima e YDUQS (ex Estácio) passaram a ser os grupos que dominam o setor privado da educação superior.
Agora, nestes primeiros anos da 3ª década do século XXI, de 2021 em diante, após pandemia, com o crescimento intenso da oferta de cursos EAD os grandes grupos que se estabeleceram a partir de um ensino presencial, com instalações físicas hoje consideradas megalomaníacas vemos os executivos destes grupos, que por anos acusaram os mantenedores anteriores (dos grupos que foram incorporados) de retrógrados e de gerirem olhando pelo retrovisor, assumindo esta posição de conservadorismo e de saudades do passado do presencial, atuando como os conservadores contra as mudanças tecnológicas e a nova realidade de atendimento a um perfil de aluno muito mais cliente e menos produto e com necessidades mais atuais e menos tradicionais.
Como defender educação on line, sem estruturas físicas com centenas de prédios estruturados para receber alunos? Como investir em inovações tecnológicas se as receitas caíram com a multiplicação de concorrentes? Como valorizar o seu curso, como diferenciar a sua oferta se a proposta pedagógica está travada em diretrizes arcaicas de bacharelados? Como romper com as inovações defendidas como a solução e hoje decrépitas a luz de recursos tecnológicos econômicos e de alta aplicação, ainda não reconhecidas?
O desespero pela abertura de novos cursos de Medicina, ampliação de Vagas dos cursos oferecidos parece a boia de salvação mais próxima, mas de verdade, pode se tornar a última cartada de grandes grupos que veem saídas oportunistas e não como parte de um planejamento estratégico.
O uso de squads na execução de projetos faz todo sentido, mas na organização institucional, esta agilidade, esta falta de foco e de propósito tende sim a ajudar a esfacelar marcas e com elas as suas mensalidades.
A realidade do negócio educação superior mudou, da mesma forma que a produção manual passou para a produção em escala de maneira automatizada. Ainda continuamos consumindo medidores de água e luz, mas hoje são de plástico, e não de chumbo …
Sendo a educação um bem social, lembrando da LDB, o produto deste setor é inspiracional, precisa ser motivador, precisa ter vínculo com a continuidade do estudo, ao mesmo tempo que precisa ser eficiente, econômico, e mais ainda dinâmico para aceitar mudanças trazidas pelos setores que empregarão os formados nos cursos de graduação.
As mensalidades estão baixas? O custo dos cursos está correto?
Retomando o início do século XXI e tendo a AMBEV como referência, só na estrutura orçamentária e não na organização do negócio, vale lembrar do OBZ, orçamento base zero, partir de novas premissas e não fazer o novo ano a luz e aos moldes do anterior.
Será que as TOP 4 do setor educacional estão dispostas e construir o orçamento de seus cursos tendo como base:
Campus Digitais – Ambientes Virtuais de Aprendizagem – que custam R$5,00 (cinco reais) aluno mês versus os custos de luz, água, IPTU e instalações das salas físicas;
Bibliotecas digitais – que custam R$4,00 (quatro reais) aluno mês versus acervos físicos em bunkers físicos;
Laboratórios em Nuvem – que custam R$2,50 (dois reais e cinquenta centavos) aluno mês versus os antiecológicos e não renováveis laboratórios de computadores que consomem espaço e energia;
Docentes por aluno – que custam, ao menos, 5 vezes menos do que aplicados nos cursos presenciais que não tem em média 60 alunos por professor por disciplina;
Ferramentas de chats – que custam centavos ao mês versus as salas de estudos que ficam abertas e empoeiradas nos campi e consumindo receita para existirem;
Ferramentas de IA capazes de elaborar provas e corrigí-las, ao invés das horas de docentes mal utilizadas em tarefas repetitivas.
Rever seus custos a partir de uma nova e possível realidade é aceitar que a tecnologia existe, é mais barata e mais acessível e eficiente, porém como exige o OBZ é destruir onde estão e aí vem a autoproteção como elemento que impede este movimento.
A chegada de startups, de marcas; que se mostraram frágeis em seus propósitos para conseguirem sobreviver os primeiros 5 anos padrões do período de maturação na educação ajudou a acelerar as mudanças, mas muitas destas não chegarão ao recredenciamento, como muitas não passaram da etapa da portaria e nem se tornaram reais com alunos.
Neste artigo, vamos ser justos com a AFYA que compõe as TOP 5 do setor e que traz um propósito, já se posicionando, na partida, como um grupo que atua em saúde de maneira vertical e atuar em educação regulada de graduação é só mais um serviço de seu conglomerado.
A chegada de outras marcar fortes em outros setores, visando se posicionar como atores na educação superior visando atender lacunas de demanda de profissionais em setores como o de tecnologia e financeiro (negócios) é algo a se avaliar com o tempo, se estes mantenedores, corporações habituadas a terem crescimento rápido e margens significativas em outros negócios, se satisfarão com margens mais apertadas, com mudanças menos velozes e comprometimento de recursos e de tempo com esta nova etapa de serviços. Todos lidam com pessoas, mas a educação tem o vínculo da pessoa, do aluno, no resultado do que se oferta como serviço.
O setor não aceita mais ilusionistas, a verdade se mostra mais rapidamente, não se constrói nada por muito tempo …
A purificação do setor, independente do regulador, acontecerá. Qual a única chance de novas receitas que pode salvar alguns grupos, a oportunidade de verticalização e a oferta de educação profissional de nível médio, comprada pelos estados via FUNDEB para implantar a reforma do ensino médio, que para terror de muitos grupos, está congelada pelo governo federal, e tudo isto só promete ser resolvido a partir de 2024, ou mais …
Até lá, quem conseguir romper com as suas amarras e construir projetos inspiracionais e com diferenciais tecnológicos e metodológicos realmente perceptíveis pelos leads, que são muitos, estará dando um grande passo para a continuidade de seu negócio.
Os Leads são muitos, mas precisam ser instigados a se inspirar e a mais importante inspiração é a possibilidade de empregabilidade, a chance de receita e a valorização do currículo.