IA Generativa capacitará professores para transformar a educação, exceto os superficiais

Será que a Inteligência Artificial (IA) Generativa é a tecnologia que marcará o ponto de transformação definitiva esperado por muito tempo na educação? Essa pergunta está presente no “Relatório de Monitoramento Global da Educação: a tecnologia na educação: uma ferramenta a serviço de quem?”, produzido em 2023 pela UNESCO.

O estudo menciona que embora muitas tecnologias que antes foram promovidas como transformadoras não tenham correspondido às expectativas, o simples aumento do potencial computacional por trás da inteligência artificial generativa permitiria a especulação a respeito de seu protagonismo na construção de um novo ambiente educacional em todo o mundo. 

Independentemente da resposta à pergunta da UNESCO, o fato é que a aplicação de novas tecnologias sempre foi um diferencial positivo em qualquer setor, promovendo o aprimoramento em aspectos como qualidade dos produtos e serviços desenvolvidos e na segurança e melhoria das condições de trabalho, por exemplo. Isso é fato, mesmo considerando que, em muitos casos, o equilíbrio em qualquer aplicação tecnológica tenha acontecido décadas depois de seu primeiro uso.

Claramente, no setor industrial a inovação a partir de recursos automatizados garantiu maior controle das variáveis de atendimento exclusivo ao cliente, padronização das partes essenciais, proteção do trabalhador no uso dos recursos de segurança de operação dos equipamentos, instrumentos e ferramentas. A utilização de máquinas de comando numérico, controladas por programação, permitiu a produção em larga escala de produtos e peças dentro de um padrão estabelecido de qualidade.

E os operadores das máquinas tradicionais? Foram capacitados a operar as mais modernas e deslocados para outra etapa mais salubre do processo produtivo. Ou migraram para outra atividade dentro do seu saber.

Acontecem perdas e não aproveitamentos? Sim, sempre. Mas de impacto inferior ao impacto dos benefícios da inovação.

Acho adequado comparar o uso da Inteligência Artificial à Revolução Industrial que, a partir do seu motor a vapor, trouxe insights para todos os dispositivos que desenvolvem movimento ou que realizam trabalho com o movimento de um rotor (parte móvel do motor). Ou comparar com a Prensa Gráfica de Gutenberg que assegurou a base de todo aprendizado e a transmissão das informações por todo o território e espaços conhecidos.

Há quem culpe a Revolução Industrial pela poluição que gera o aquecimento global. Há quem culpe Guthemberg pelas fake news, e é assim que o mundo se movimenta. Paciência.

No caso do setor educacional, usar o ChatGPT como ferramenta para otimizar a produção de slides, preparar questões, planejamento de aulas, avaliações de alunos e, até mesmo, elaborar um texto sobre desafios e seus impactos, não assusta os educadores que não se limitam aos slides ou às páginas de teorias já escritas e traduzidas – nem mesmo às perguntas básicas e óbvias de aplicação simples do conhecimento.

A experiência internacional também comprova isso. Segundo o estudo da UNESCO, os chamados Recursos Educacionais Abertos (REA) incentivam a reutilização e a adaptação de materiais para diminuir o tempo de desenvolvimento, evitam a duplicação do trabalho e tornam os materiais mais específicos ao contexto ou relevantes para os estudantes. Eles também reduzem de forma significativa o custo do acesso ao conteúdo. No estado de Dakota do Norte, nos Estados Unidos, um investimento inicial de US$ 110 mil para migrar para REA economizou mais de US$ 1 milhão em custos com estudantes. As redes sociais aumentam o acesso a conteúdo gerado por usuários. O YouTube, um dos grandes atores da aprendizagem tanto formal quanto informal, é utilizado por cerca de 80% das 113 melhores universidades do mundo. 

Ademais, ferramentas digitais colaborativas são capazes de aperfeiçoar a diversidade e a qualidade da criação de conteúdo. Na África do Sul, a iniciativa Siyavule apoiou a colaboração de professores na criação de livros didáticos de educação primária e secundária.

Pensando na relação professor/aluno, os impactos positivos vão além, alcançando um aspecto humanizador. A adaptação personalizada do aprendizado, atende às necessidades únicas de cada indivíduo, é um exemplo de prática possível com essa – nem tão nova – ramificação da tecnologia.

Os bons educadores trazem as suas vivências e seus diferenciais profissionais em suas falas e abordagens, que reúnem o conhecimento adquirido ao longo de suas histórias. A inteligência artificial pode replicar e criar, mas a vivência é única! Para estes, os novos mecanismos são auxiliadores. Um recurso a mais para inovar.

Esses também podem aproveitar as diversas formas de incentivos para acelerar a união entre os dois saberes.  Segundo o estudo da Unesco, cerca de metade dos sistemas educacionais em todo o mundo tem padrões de TIC para professores, incluindo quadro de competências, estrutura de formação de professores, e plano ou estratégia de desenvolvimento. Os sistemas educacionais organizam dias anuais de educação digital para os professores, promovem REA, apoiam a troca de experiências e de recursos entre professores e oferecem formação. Um quarto dos sistemas educacionais têm legislação para garantir que os professores sejam formados em tecnologia, seja por meio da formação inicial ou em serviço. Cerca de 84% dos sistemas educacionais têm estratégias para o desenvolvimento profissional de professores em serviço, em comparação com 72% para a formação de professores pré-serviço em tecnologia.

Enquanto isso, para os rasos e arcaicos de saber, a IA é uma ameaça. Afinal, antes mesmo do “boom” da inteligência artificial, as normalizadas aulas baseadas em PPTs e leituras de livros nunca foram “boas aulas” e, na maioria dos casos, sequer desenvolvem um real saber.

Por Francisco Borges (Mestre em Educação e consultor da Fundação de Apoio à Tecnologia (FAT).
Publicado primeiro em: CRS São Paulo (https://crsaopaulo.com.br/ia-generativa-capacitara-professores-para-transformar-a-educacao-exceto-os-superficiais)
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