Da ETEC São Paulo para o Mestrado na Finlândia – Entrevista com Bruno Rubio

Eu me sinto honrado em contribuir de alguma forma contando a minha experiência, e feliz por recordar minha época de estudante da FATEC.

Quando somos estudantes, às vezes é muito difícil ver o horizonte. Você está estudando e não sabe se está no caminho certo, e frequentemente tem a sensação de que tudo é uma perda de tempo. Só vai perceber como tudo foi importante muito tempo depois.

Muitas vezes pensei em desistir, mas recebi incentivo tanto dos amigos, dentro e fora da faculdade, quanto da minha família, e não ter abandonado o curso, ter ficado até o fim, foi a melhor escolha que eu poderia ter feito.

Minha trajetória começou quando eu fiz o vestibulinho e passei na ETEC São Paulo. Na época creio que faltava maturidade para saber que aquelas escolhas seriam determinantes para meu futuro profissional, por isso acho importante que o jovem entenda a importância de persistir, de ir em frente.

Eu nasci e cresci na Zona Leste de São Paulo, em São Miguel Paulista. Meus pais se sacrificaram bastante para que eu pudesse estudar em um colégio particular, que embora não fosse muito caro, demandava uma parte importante da renda familiar. No final do ensino fundamental, comecei a me interessar pelos vestibulinhos, especialmente os das escolas técnicas. Foquei nos estudos e entrei na ETEC, que é um “microcosmo” de uma faculdade. Eu achava estranho que no final das aulas ou no intervalo não havia sinal, e era minha responsabilidade saber quando a aula começava e terminava. Os professores não se preocupavam caso um aluno saísse para o intervalo e não retornasse, por exemplo. Na ETEC o aluno é dono do seu nariz, e sabe de seus deveres.

Quando você vê as estatísticas de candidatos apovados no vestibular das faculdades públicas, é notória a alta quantidade de alunos das ETECs, pois o próprio vestibulinho já é uma preparação para o vestibular, e o aumento de responsabilidade é um diferencial em relação aos alunos de escolas públicas ou particulares do ensino fundamental.

Outra característica interessante de estudar em uma ETEC é o convívio social com colegas de diferentes bairros, o que não acontece nas outras escolas, onde os alunos são, geralmente, da mesma região. Aprendi a explorar a cidade e o espaço urbano, parques e praças. As pessoas eram diferentes, de bairros diferentes, com opiniões e vivências muito distintas da minha realidade, o que ajudou a ampliar minha visão de mundo. Isso foi em 1999, eu tinha 15 anos, e minha turma de ETEC se reúne anualmente até hoje.

Curso superior e a formação de Tecnólogo

Depois do ensino médio fiz um ano de cursinho e entrei na FATEC Zona Leste em 2003, cursando Análise e Desenvolvimento de Sistemas.

Uma dúvida recorrente que eu tinha era a validade do diploma de tecnólogo e não de bacharel. No entanto, eu nunca tive nenhum problema com a formação de tecnólogo na minha vida profissional. Inclusive na aplicação para o meu mestrado na Finlândia não houve diferença alguma. Eu descobri que em muitos outros países a graduação em 3 anos é normal. Eu tenho colegas de países como Irã, Paquistão, Marrocos e nossa formação é muito parecida, então o ensino da FATEC não deixou nada a desejar em relação a outras instituições internacionais.

A área de Exatas sempre foi meu objetivo porque sempre fui aficcionado por video games, e queria algum curso que me levasse para essa área. Durante a faculdade me dei conta que o curso não era exatamente o que eu esperava. Percebi que eu não tinha criatividade ou talento para fazer jogos e o que eu gostava mesmo era de falar e escrever sobre eles, discutir o mercado, tendências e novidades da área. Assim, passei a me identificar mais com a área de Gestão, tanto que meu TCC foi sobre o mercado de videogames.

Mercado de trabalho

No final da faculdade eu estava trabalhando como escriturário na Prefeitura de São Paulo, depois mudei para o Conselho Regional de Medicina, mas esses empregos não tinham muito a ver com a minha área de formação.

Quando me formei, uma amiga me indicou para um grupo de TI na Secretaria de Assistência Social. Era um trabalho de apenas 6 meses, sem nenhuma garantia ou estabilidade, mas entendi que era o momento de arriscar. Esses 6 meses viraram 3 anos e foi um período de muito aprendizado, tanto na área técnica de bancos de dados quanto sobre a realidade social do país.

Saí desse trabalho para entrar na TAM Linhas Aéreas (hoje LATAM Airlines), também para trabalhar com banco de dados na área de Controle de Gestão, ou Revenue Management (gestão da receita). Nesse momento estava fazendo uma Pós-graduação Lato Sensu em Business Inteligence e migrei para essa área dentro da Companhia. Foi um período duro, de muito trabalho com um time multidisciplinar de brasileiros e chilenos, o que foi importante para a minha formação.

Finlândia

A LATAM decidiu centralizar a área de BI apenas no Chile e foi o momento de sair da empresa. Foi quando decidi procurar um curso fora do país. Fui a uma feira de universidades estrangeiras e procurei um curso de mestrado que tivesse um custo apropriado e dentro da minha área. Optei por um curso de Big Data na Finlândiaentão os pontos se uniam: Analista de Dados, Business Inteligence e Big Data.

Para ilustrar o que é essa área, tente imaginar milhões e milhões de usuários acessando o Pokémon Go, por exemplo. Como você armazena esses dados? Como você organiza e trata essas bases? Como extrair informações relevantes a partir de dados que crescem exponencialmente a cada momento? E esse é apenas um exemplo básico de aplicação, uma vez que o Big Data está presente em qualquer setor produtivo, desde saúde, gestão pública ou aplicações financeiras. É um universo novo e vasto para pesquisa.

Fui aceito na University of Tampere enquanto enfrentava um novo desafio: atuar como consultor para as empresas LATAM Travel e SportsWorld na organização dos jogos olímpicos do Rio de Janeiro. Foi uma experência extremamente rica, mais uma vez atuando com numa equipe com brasileiros e estrangeiros, em um projeto sem nenhum precedente no Brasil.

O mestrado não está sendo fácil. O estudo é muito puxado, as aulas, as tarefas e as provas têm uma dificuldade alta, por isso eu e meus colegas de curso nos reunimos para estudarmos em grupo.

Apesar da distância não me sinto só, pois a tecnologia facilitou muito o contato com a minha família e meus amigos, então não tenho certeza se vou voltar para o Brasil. Hoje eu vou para onde a oportunidade surgir.

O garoto de São Miguel Paulista virou um cidadão do mundo.

Reconheço a dificuldade de olhar para frente e ver apenas pontos de interrogação e dúvidas, mas se puder levar alguma mensagem aos estudantes, resumo em apenas duas palavras: persistência e resiliência.

Persistir se encaixa no tal de “siga seus sonhos”, que todo mundo diz. É um dos maiores clichês, mas justiça seja feita, é o que nunca sai de moda. Não acontece de um dia para o outro, mas é algo que vai tomando forma tal qual uma casa sendo construída tijolo por tijolo.

A resiliência é necessária para todas as adversidades que, sem escapatória, surgirão no caminho. Seja para entrar na faculdade, seja para continuar nela. No fim das contas, o esforço de estudar vale a pena.

 

Em tempo:



Em 2009 Bruno recebeu um convite para atuar como jornalista freelancer para as revistas EGW (Entertainment Game World) Nintendo World (revista oficial da Nintendo), ambas publicações da Editora Tambor. Desde 2011 Bruno cobre a maior feira mundial de games, a E3 em Los Angeles.