A Câmara dos Deputados finalizou a votação da lei que cria o novo ensino médio
Entenda o que muda nessa nova proposta de Ensino Médio em contraponto ao que foi pensado desde 2017. Assista à entrevista da RF News com Francisco Borges, Consultor de Regulação Educacional da Fundação FAT.
Leia a entrevista na íntegra:
Tatiana Broisler: E a Câmara dos Deputados finalizou a votação da lei que cria o novo ensino médio. O texto segue para a sanção presidencial. O texto já havia sido aprovado pela câmara em março, mas foi alterado no senado, o que obrigou o projeto a passar por uma nova análise dos deputados. Agora o presidente Lula pode aprovar integralmente, vetar trechos ou vetar tudo, e para entendermos melhor como será o novo Ensino Médio, eu converso agora com Francisco Borges, consultor de Regulação Educacional da Fundação FAT.
Boa noite Francisco, seja muito bem-vindo ao RF News.
Francisco Borges: Boa noite Tatiana, prazer estar com vocês, obrigado pela oportunidade.
Tatiana Broisler: Francisco, o que muda essa nova proposta de Ensino Médio?
Francisco Borges: Na verdade, a gente volta ao modelo anterior à reforma. Ou seja, eu chamaria essa reforma de “contrarreforma”. A reforma anterior previa a utilização de um tempo maior do Ensino Médio para disciplinas que tivessem mais atração para o aluno. De verdade, as disciplinas que são da educação profissional. Esta contrarreforma traz de volta componentes curriculares básicas e uma carga horária bastante intensa desses conteúdos, o que faz imaginar que nós voltamos ao modelo anterior, questionando tudo o que foi pensado desde 2017.
Tatiana Broisler: E na sua opinião, a ampliação da lista de disciplinas obrigatórias, ela é positiva?
Francisco Borges: Infelizmente não. O grande problema que nós temos na educação brasileira não é só a falta de tempo de estudo, é a quantidade de temas que a gente dispõe, propõe para os alunos estudarem. Nós temos que estudar de uma diversidade da área de Biológicas até a área de Humanas, passando por todas as Exatas em 3 anos do Ensino Médio, quando, de verdade, a gente deveria trabalhar temas importantes que são linguagem e uso real da matemática, em situações de educação financeira, toda a parte de Ciência aplicada à educação básica. O que nós estamos fazendo é discutindo mais do mesmo, e os alunos perdem interesse.
Tatiana Broisler: Por isso está sendo muito discutido aí a carga horária, muita reclamação em torno disso. Mas o conteúdo que deveria estar aí sendo discutido, isso parece que não está sendo muito discutido.
Francisco Borges: É impressionante, a gente fica pensando no “Ok” e esquece que o principal ponto da evasão dos alunos é a forma, as aulas expositivas em sala de aula, a qualidade dos professores, e tudo isso dizendo que você precisa deixar o aluno mais tempo na escola para igualar o rico com o pobre, não é verdade. A escola particular já pensou numa metodologia, num material diferenciado, enquanto a escola pública continua com esse modelo de sala de aula e lousa e professores que são mal remunerados, e que têm que trabalhar em mais de uma instituição de ensino para ter uma remuneração condizente. Então, estamos discutindo “tempo”, quando devíamos discutir “o que” e que recurso tecnológico poderia acelerar e motivar o aluno, não é?
Tatiana Broisler: Era isso realmente que eu ia te perguntar: porque uma das preocupações aí que nortearam o novo ensino médio são praticamente duas: diminuir a evasão, tornando a escola mais atraente, e aumentar o aspecto profissionalizante do ensino. É possível cumprir esses dois objetivos com esse modelo que eles estão propondo?
Francisco Borges: Infelizmente eu enxergo que nós retrocedemos muito, porque nós ampliamos a quantidade de temas e disciplinas, a carga horária foi mantida as 2400 horas, que significam 400 horas por semestre, e não se discutiu como o aluno poderia trabalhar todos esses temas de forma atrativa, de forma interessante. Esse é o grande problema que a gente sente, que a gente investe muito dinheiro na educação, mas de maneira equivocada.
Tatiana Broisler: Dados divulgados pelo IBGE mostram que o ensino das crianças mais ricas chega a quase 8 anos à frente das crianças de baixa renda, pelo menos no que diz respeito ao tempo de estudo. Os dados mostram que essa defasagem começa logo nos primeiros anos. Quais são os maiores desafios hoje no ensino?
Francisco Borges: Tatiana, o principal problema que nós temos na educação brasileira é a qualidade do professor, e não é uma qualidade por conta da formação do professor, mas por conta da carreira. Os professores das escolas públicas, eles não têm motivação de estarem lá, e os alunos também não, e os professores deixam de educar e passam a mediar e ter que tratar de problemas que não são relacionados à educação. O que numa escola particular, com recursos diferenciados, com coordenação, material didático que torna a trajetória mais atrativa, ela é mais interessante. Por isso o aluno da a escola pública, ele evade com muito mais facilidade do que na escola particular, ou seja, este modelo educacional está mais servindo para diferenciar o rico do pobre do que para fazer algo mais igualitário. As escolas particulares estão resolvidas, são as públicas que têm problemas sérios de professores e de metodologia.
Tatiana Broisler: E que precisam ser resolvidos urgentemente. Francisco, muito obrigada pela sua participação aqui no RF News.
Francisco Borges: É uma honra, muito obrigado, à disposição.